
Tomei uma decisão, que é claro, pode ser revogada. Decidi que minha principal tarefa filosófica será distinguir entre o real e o ideal. Distinção esta que não pode ser afetada por qualquer cosmovisão que seja: monista, dualista ou pluralista, ou por um posicionamento epistemológico dogmático ou idealista. Indepentemente de tudo isto, é claro, que o entendimento humano faz distinção entre duas esferas de ser, uma real e outra abstrata. A primeira está a princípio ligada à afetividade, apreendida pela intuição sensível. A segunda está ligada à atividade reflexiva da consciência no âmbito do entendimento, onde operam as leis formais do pensamento, mas de qualquer forma pode ser considerada como uma intuição intelectual.
Distinguir o ideal do real, eis minha tarefa. Identificar o que faz parte de um e de outro. Sabendo que o homem tem consciência destas duas esferas do ser, uma outra tarefa da minha atividade reflexiva será então analisar a relação entre estas duas esferas. Visto que não posso, enquanto consciência pensar as duas como esferas autônomas. Nem tampouco posso pensá-las como idênticas. Como minha reflexão é atividade do entendimento, não posso deixar de investigar a razão suficiente da passagem do ideal para o real e do real para o ideal.
A pertinência desta tarefa é que o real e o ideal são duas categorias chaves para entender a atividade humana, visto que o homem é consciência em atividade. Esta atividade chamo de existência temporal, em que o homem não é livre para não agir. Porém, seu agir pressupõe a consciência do ser e do dever-ser e esta pressupõe a liberdade entre ser e não-ser. Pois, a consciência apreende a contingência do ser e do dever-ser. Ora, isto é relevante para minha própria existência, pois preciso compreender meu modo de agir e o modo de agir dos outros. Preciso compreender a necessidade e natureza das prescrições éticas da conduta moral humana.
Também julgo necessário esta reflexão pois até mesmo a atividade científica é afetada por esta distinção entre ideal e real. Vive-se numa época de grande avanço tecnológico, graças ao sucesso prático da ciência contemporânea. Porém, até que ponto posso atribuir valor universalizante às proposições científicas? Até que ponto a existência deve ser compreendida por meio da essência? Qual a base lógica para se afirmar a precedência da essência determinada em relação à existência temporal? Na minha opinião, estas respostas são decisivas para uma avaliação do discurso humano.
Concluindo, hoje, tomei esta decisão: distinguir no ser o ideal do real e investigar a relação mútua entre os dois aspectos.