12 de agosto de 2010

INEVITÁVEL QUEDA

Ao nascer,
Eu me precipitei!
Quem me dera, fosse eu um decadente Ícaro,
Que voando até às alturas,
Contempla o Fantástico
Tirado da cartola do Ego Mágico.
Mas, não! Sem asas, nas Alturas Nasci.
Nas Alturas eu me perdi.

Nada havendo além do Ápice,
Das Alturas me precipitei!
Sim, caí!
Caí sobre o chão frio da Realidade,
Definida pela convenção dos homens,
Que vivem sob a sombra da sobriedade.
Projetada pela ingênua e frágil Racionalidade.
E mesmo assim, com fineza,
Quer definir e determinar todas as coisas
Dentro da absurda norma da Normalidade,
Que inutilmente quer domar
A fera e indomável Felicidade.

A vida é esta tragédia,
Onde meu sangue é o Tempo, é a minha própria Vida,
Que escorre, se esvaí ,
Pelas veias abertas,
Que jorram sob o Sol e
Sobre o Solo onde jaz caída minha vã e inútil Liberdade,
Que busca como Sísifo a fugaz Felicidade,
Mas que sempre vai de encontro da Senhora Necessidade!

Que é a vida,
Além da passagem do Nada ao Nada?
Este breve e efêmero suspiro,
Pausa da minha Particular Inexistência,
Efetivação daquilo que eternamente
Existe como uma das infindas Possibilidades?

Que é a Vida,
A não ser esta queda do Possível ao Real,
A Morte do Latente,
Cujas veias secam a cada instante,
Neste renovado e agonizado Real Presente?

Que é a Vida,
A não ser este breve intervalo,
Em que dura minha queda
Do Nada das Alturas
Ao Nada das Baixuras?

Que é a minha vida,
A não ser este ignóbil e coadjuvante herói Radical,
Que contracena na titânica e eterna Luta
Dos Monstros Pré e Pós da histórica vida existencial?

Ao nascer, caí.
Sim, caí do Nada para o Nada.
E esta é a vida, uma Queda,
Queda que é Nossa Queda,
Inevitável, rápida ou lenta, Queda.

Então, caído, acordo deste Sonho...
E o Nada se lembra do Nada e se casa com o Nada...
E vivem felizes para sempre!

Johannes de Silentio.

28 de setembro de 2009

A Pele de Onagro e a Morte no Horizonte da Existência

Dostoiévski colocou uma questão intrigante e desafiadora: Se não há imortalidade, tudo é permitido? De que modo censurar em alguém o prazer vicioso e sem limites do presente, em prol de um prazer de um futuro incerto de uma vida virtuosa pautada pela sabedoria?

Balzac, escritor francês do século XIX, escreveu várias obras de uma qualidade elogiável. Uma destas foi o romance A Pele de Onagro, primeira dele que se destacou no meio crítico. É um romance que faz a mistura de elementos realistas e fantásticos. Embora original, tem um enredo que lembra um pouco o Fausto de Goethe, que insatisfeito com os frutos de sua vida intelectual, vendeu a alma ao diabo a fim de obter poder e experimentar um sentido satisfatório na vida.

Raphäel é o protagonista principal. Jovem pobre, de talento intelectual distinto e com uma insaciável vontade de experimentar os prazeres de uma sociedade parisiense aristocrática, cheia de encanto, com suas mulheres coquetes, com seus banquetes e todos outros atrativos de uma vida voltada ao elegante, ao extravagante, ao belo, ao alegre e ao dinheiro. Após desprezar Pauline, moça linda, por ser pobre, apaixona-se por uma mulher coquete e sem coração Fedora. Enfim, desprezado friamente por esta, apesar de todos sacrifícios financeiros, feitos sob a falsa aparência de status e riqueza, o mesmo se lança à vida do jogo onde encontra sua ruína total. Nesta situação deseja morrer.

No dia que decide se matar, encontra um velho que lhe oferece um talismã mágico, uma pele de onagro (uma espécie de jumento do oriente). Nesta havia uma inscrição em sânscrito: "Se me possuíres, possuirás tudo. Mas tua vida me pertencerá. Deus quis assim. Deseja, e teus desejos serão realizados. Mas regula teus desejos por tua vida. Ela está aqui. A cada desejo, decrescerei assim como teus dias. Queres-me? Toma-me. Deus te atenderá. Assim Seja."

Raphäel aceitou possuir o talismã, sem levar muito a sério as consequências do poder destruidor do mesmo. O primeiro desejo foi participar de uma grande festa, cheia de orgias, com convidados ilustres, jovens, alegres e intelectuais, com belas mulheres ardentes e com muita bebida. O que aconteceu. E depois desejou ficar milionário. O que também aconteceu. Tal foi a surpresa dele quando percebeu que a pele de fato estava diminuindo.

É neste ponto que a morte surge no horizonte da existência. Raphäel apercebeu-se de que a cada desejo satisfeito sua vida ia se aproximava do fim, por conta do pacto que fez ao tomar para si o talismã. Interessante é que quando vivia numa situação de pesar, sofrimento, humilhação e pobreza, a vida era-lhe desinteressante. Mas, agora, tendo todo poder para desfrutar da fama e dos prazeres, a vida agora lhe aparecia como algo de alto valor. Temendo a morte, Raphäel tornou-se praticamente um eremita, isolou-se na sua mansão a fim de não se colocar em situações nas quais seus desejos pudessem ser despertados. Mas, não podia evitar o contato social, que aos poucos foi lhe seduzindo.

Durante todo o restante do livro, Balzac mostra a relutância e os cuidados de Raphäel para adiar sua morte, o que era algo inútil. Pois a morte se afigurava como uma realidade inevitável, uma vez que era impossível viver uma vida sem desejos. Porém, surge uma questão para o leitor: Inevitável não é a morte para todos os seres humanos, independente do talismã ou não? Eis uma das condições da existência. Condição esta que torna a existência humana, caracterizada como uma infinda fuga do presente, como uma fuga para o nada. O homem que se orienta sempre a um futuro, vislumbra no horizonte da existência a Morte.

Que vale ter um poder de satisfazer todo desejo se este poder não é suficiente para deter o destino inexorável que é a Morte? Neste contexto de uma existência condicionada à mortalidade, que implica na finitude da vida, na limitação e na restrição de uma vida insaciável de desejos, surge a questão prática de como se portar na vida. Orientar a existência à busca da virtude e da sabedoria ou então ao esgotamento de todas energias na busca por uma satisfação, inconseqüente, de todos os desejos, usufruindo de um prazer instantâneo e vicioso?

Nesta obra Balzac desafia-nos a censurar racionalmente a prostituta, que imprudente, cheia de vícios e extravagâncias interpelada sobre seu futuro responde: "O futuro? ... Que é que chama de futuro? Por que hei de pensar numa coisa que ainda não existe? Nunca olho para trás nem para diante de mim. Já não é bastante ter de me ocupar com o dia inteiro duma vez só? Além disso, o futuro já conhecemos, é o asilo." Preferindo viver uma vida voltada aos prazeres, enquanto durar os encantos da beleza, esta mulher prefere a vida cheia de vícios, ciente de que possivelmente terá uma velhice desconfortável e sem encanto desprezada pelos homens. Raphäel parece incapaz de censurar esta mulher e mesmo intrigado com o comportamento da prostituta, reflete através de uma pergunta retórica com seu amigo que independente do modo de vida "quer vivamos com os sábios ou morramos com os loucos" o resultado é, cedo ou tarde, o mesmo.

Concluindo, Balzac coloca em sua obra, A Pele de Onagro, a questão do significado da existência e o impacto da morte sobre ela, fazendo refletir sobre a fragilidade até mesmo de um poder ilimitado para satisfazer um querer insaciável. E por fim fica a questão: que diferença faz para um ser, que só pode vivenciar um presente fugidio, o estilo de vida vicioso ou virtuoso, sábio ou louco, prudente ou inconseqüente, se a morte até agora tem se mostrado como um destino inevitável?

Johannes Alienus Amens.

26 de setembro de 2009

Fado de Sísifo



Em seu olhar, o brilho opaco da salvação,
Em seu rosto, a realidade da doce loucura,
Em suas pernas, o esforço fatigante àquela altura,
Em suas mãos, o empurrar uma pedra em vão!
E em vão, vão-se os dias e ele naquela labuta,
Numa guerra, em que se trava uma inútil luta!
E que luta! Luta absurda! Luta perdida! Perdida a priori!
Mas, em su'alma, a esperança irracional a posteriori.
Enfim, o regozijo de ver a pedra no ponto mais alto da montanha.
Trabalho feito! Desfeito! Eis a pedra rolando ao pé do monte.
Enfim e que fim! Agora não mais é regozijo, mas prejuízo!
Em suas mãos, o nada de nenhuma tensão,
Em suas pernas, o movimento leve da descida,
Em seu rosto, a idealidade amarga da razão,
Em seu olhar, a opacidade brilhante da perdição!

Amens, Ilúcido na Plenitude da Razão!

Bolero de Ravel: Tensão Dialética entre a Idealidade e a Realidade




Ouvindo a peça musical Bolero de Ravel minha consciência não foi afetada somente pela beleza estética desta obra de arte! Beleza que produziu em mim um certo êxtase de valor inefável. Ao ouvi-la meus sentidos sentiram um gozo e satisfação estética formidável.


Sim, não foi somente meus sentidos estéticos que foram afetados... Ao ouvir a música, a melodia da mesma, em seu constante eterno retorno e ritmo invariável e uniforme, foi se manifestando à minha consciência como se fosse um espectro fantasmagórico que a cada repetição ia ganhando solidez até se tornar como algo totalmente concreto diante dos meus olhos.

Eis que esta música afetou minha Razão de tal forma que apreendi na diversidade de toda aquela repetição a Essência Melódica. Diversidade esta, manifesta ora através dos sons de instrumentos de sopro, ora por meio dos sons dos instrumentos de corda, ora até mesmo por intermédio dos sons das vozes imitando as notas musicais. Eis que foi não somente sublime e belo, foi também inteligível. Porém, um inteligível ininteligível.

A melodia repete e repete várias vezes. Ela é a mesma sempre. Sempre no mesmo ritmo invariável. Teimoso! Persistente! Eloquente! E a cada vir a ser da mesma Idéia melódica, uma Existência Sonora totalmente Singular e Particular ganha Vida! A mesma idéia, tocada em tonalidades diferentes, por meio de instrumentos diferentes, aparece a cada instante de modo totalmente novo e irrepetível. Aparece como sendo uma realidade particular incomparável e altamente individualizada.

Eis então, nesta peça musical, a dialética da essência com a existência em que: o Um torna-se Muitos, o Eterno torna-se Temporal, o Mesmo torna-se Outro, o Ideal torna-se Real, o Universal torna-se Particular. E em toda a diversidade da aparição repetitiva desta pequena melodia, apreende-se então o Paradoxo Absurdo do Intelecto que concebe versus a Sensação que percebe. Absurdo porque não é possível realizar a síntese, ficando o reino do Intelecto em tensão constante com o reino da Sensação.

Enfim, o Bolero de Ravel gerou em mim não somente um sentimento e prazer inefável, mas também a captação inteligível da Absurda Razão. Eis que o Belo é Ilógico! Eis que a Idéia é Absurda! Pois como pode ela ser e não ser si mesma? Ahhh, isto vai contra as leis inexoráveis da Lógica! A Melodia existe. Ela está em todas as repetições. Porém, nenhuma das repetições é ela.

Johannes, em contemplação absurda da Beleza do Mundo.

Sou o ENTE que mora na tua IMAGINAÇÃO


Eu sou uma pura abstração de ser.
Sou fumaça que escapa do nada.
Pura aparência de um aparecer.
Calor d'uma vaporação saturada.
E nada, do nada, para nada,
É onde, de onde, para onde,
Tudo se concilia e se converge
Formando uma substância fantástica
Constituída pela ação da tua imaginação
Guiada com a regra da fria Razão
Ou pela anarquia do insano Coração.
E em vão, é querer me tornar são,
Pois no oceano profundo da indistinção,
Não há diferença de conotação.
Não sou isto,
Nem sou aquilo,
Sou isto ou aquilo.
Sou matéria de uma forma desvanecida,
Que esvara por teus in-sentidos imaginários,
Dando-lhe o gozo de uma faustiva esperança,
A presença in-sólida de um louco sonho,
Ou então, a dor aflitiva da perdição,
A ausência sólida de uma lúcida chaga,
Que faz gemer a alma na antecipada solidão.
Não sou dor,
Nem sou in-dor,
Sou dor ou in-dor.
Sou a figura fantasmagórica do irreal
Que afeta a tua estranha realidade.
Sou o ente que habita perenemente
No interior da sombra de tua mente
Resido nos castelos de sonhos da Esperança.
Ou então nos calabouços trágicos da Angústia.
Enfim, sou teu e para-ti no impertencer,
Pois sou o nada real de tua rica mente!

Constantin Constantius.

A Eterna Duração da Efemeridade.



Na infinita extensão da eternidade
O que é a vida de um ente finito?
Cujo existir essencialmente é um não-ser.
Um não-ser isto, um não-ser aquilo,
Mesmo sendo isto, mesmo sendo aquilo.
Efêmera é a vida, é como um sonho,
Mas, também como um pesadelo.
É um faustivo ou trágico impermanecer,
Um impermanecer no gozo e na alegria,
Um impermanecer na dor e na tristeza.
Vejam o presente! Tarde demais!
Eis que já se foi, é um passado.
Avista-se ao longe o Futuro.
Mas, ele é névoa de indeterminação.
Eu passei por aqui! Eu existi. Eu vivi.
Vivi momentos faustivos de contentamento.
Que elevaram ao êxtase a minh'alma.
Mas, todos estes momentos são não-ser.
Vivi momentos de pesar, angústia e vazio.
Que esmagaram com peso infinito meu coração.
Mas, todos estes momentos, também, são não-ser.
Toda existência é um eterno infindo perecer.
Perecem belezas,
Perecem nobrezas,
Perecem as dores,
Perecem os amores,
Perecem os sentimentos.
Que busca o ente finito?
Que insensata é esta busca inútil por existir!
A vida é toda ela feita de amor, ou seja, de gozo,
Ou seja, de dor.
Pois o que se ama perece, desaparece,
Pois o amar desvanece, se esquece.
Mas, só é dor, porque foi gozo.
Só é não-ser, porque foi ser.
Quem experimenta as plenitudes da vida,
Maximiza as angústias do vazio nas perdas.
Lamentar pra que? As coisas são o que são.
Algumas coisas duram mais,
Outras duram menos,
Mas, todas elas passarão do ser para o não-ser,
Para que o não-ser passe a ser.
E assim, infinda e infinitamente,
Gira a roda de Íxion por toda eternidade.

Johannes Absente, 19 de Junho de 2009.

25 de setembro de 2009

Ausência


Ente da realidade sensível,
Procuro-te com meus olhos,
Ávidos e ansiosos para te encontrar.
Mas, em todo lugar,
O que vejo,
O que percebo,
O que apreendo
É apenas a ausência de ti.
Examino toda extensão do Ser,
Do ser sensível da minha realidade.
Mas, em nenhuma parte,
Eu consigo encontrar-te.
Como podes não-ser?
Se até agora a pouco eras?
Mistério que consome minh'alma.
Que sob o peso do nada, desaba.
Não consigo entender o porquê.
O porquê do ser pleno não me satisfazer.
O porquê do não-ser ser
Fonte de Melancolia,
Causa de Temor,
Motivo de Angústia.
Mas, o ente está aqui!
Está aí!
Está por aqui!
Mesmo eternamente sendo,
Em breve, desvanecerá como fumaça.
E tudo quando vou ver.
É a ausência de ti!
E mais um pouco, ausência de mim.
De um Mim que sempre foge,
Que escapa de mim.
Oh, que dialética cruel e generosa da vida!
Marca perene da existência,
Paradoxo absurdo que mistura
A dor e o gozo, o pesar e o prazer,
Na unidade sintética de meu ser.

Johannes Absente, 8 de Julho de 2009.

4 de setembro de 2009

Macbeth - Destino e Liberdade: Uma Leitura Existencialista do Macbeth de Shakespeare

Macbeth foi um personagem cruel de uma das mais sombrias peças teatrais que Shakespeare escreveu, cujo título leva o mesmo nome de seu protagonista. A obra, mesmo sendo, é claro, uma ficção explora um lado obscuro da humanidade, cuja análise fornece elementos esclarecedores das condições existenciais do homem.

A presença de figuras mitológicas e sobrenaturais, tais como a deusa grega Hécate, espíritos e fantasmas, bem como o papel proeminente das três bruxas, com todo enredo girando em torno do Destino e das Profecias feitas a Macbeth e a Banquo, logo no início, podem levar à uma idéia de que Macbeth tenha sido apenas um fantoche nas mãos da Necessidade, a cumprir um Destino, uma vez que este foi traçado a priori por forças "sobrenaturais".

Logo na primeira cena do primeiro ato, aparecem as três bruxas, cientes dos acontecimentos políticos, aguardando o final duma batalha, em que Macbeth estava participando, para poderem então de modo premeditado se reunirem e se encontrarem com este no pântano. E este encontro acontece logo após o Rei Duncan ter nomeado Macbeth barão de Cadwor, recompensado-o pelo modo como lutou e se portou na batalha. Neste ponto do drama, Macbeth é visto como um herói, homem nobre, digno de honra e de confiança. Uma imagem totalmente oposta da que ele veio a ficar sendo conhecido, como tirano sanguinário cujo nome tinha sinônimo de horror.

Sugestiva são as palavras finais das três bruxas no ato 1, cena 1: "Faire is faule, and faule is faire..." que podem ser traduzidas com uma expressão paradoxal: "o belo é feio e o feio é belo". Esta idéia é marcante em toda obra, onde os julgamentos dos personagens estão constantemente equivocados, tomando várias vezes o nobre pelo vil e o vil pelo nobre. Macbeth, visto como herói pelo Rei Duncam, revela-se depois como pior do que o antigo barão de Cawdor, que se rebelou contra o reino e foi executado por traição. É interessante esta idéia de ambiguidade, pois a existência sendo distinta da essência, carrega em si toda uma série de ambiguidades, onde num movimento dialético, alternam-se elementos contrários entre si, na formação de uma síntese, como o feio e o belo, que às vezes coexistem numa mistura estranha.

Esta tragédia gira em torno da idéia lançada no primeiro encontro das bruxas com Macbeth e Banquo. Elas dirigem àquele três saudações, chamando-o primeiramente de barão de Glamis, depois barão de Cawdor e por fim de futuro Rei. Neste momento Macbeth ignorava que o Rei Duncam o havia nomeado barão de Cadwor. E fica surpreendido com tais saudações. Depois de inquiridas, as bruxas também se pronunciaram acerca de Banquo, dizendo-lhe que este não seria rei, mas teria filhos reis. Aqui, Macbeth e Banquo são apresentados a um Destino "traçado". Mas, será que este estava mesmo determinado de antemão?

Embora, Shakespeare faça uso de figuras sobrenaturais, míticas e fantásticas, pode-se notar que as ações de Macbeth, bem como os acontecimentos que o levaram a ser rei e mais adiante levaram à sua morte, seguem um curso bem natural. As palavras das bruxas, mais do que profecias, podem muito bem ser entendidas como motivadoras e manipuladoras, explorando a vaidade e orgulho das condições psicológicas humanas de Macbeth e Banquo. Afinal, quando elas o saudaram de barão de Cawdor, ele já havia sido nomeado.

Macbeth então tem diante de si um Destino anunciado. Poderia evitá-lo? Em sua vaidade e em seus desejos mais ocultos do coração desejava ser Rei e portanto escolhe ir ao encontro de seu Destino. Mas, ele não se coloca como alguém passivo, esperando que a Necessidade lhe torne Rei, mas ele mesmo dá um jeito de ir ao encontro de seu Destino anunciado. No começo, houve nele uma luta entre o ser (seu desejo) e o dever-ser (obrigações morais). O ser do desejo de ser Rei conflitava contra o Dever-Ser moral de não atentar contra a vida do Monarca. Porém, com a influência "maléfica" de sua esposa, Lady Macbeth, a quem relatou apenas parte das profecias, omitindo as palavras proferidas à Banquo, ele então comete o assassíneo do Rei Duncan, aproveitando o fato de que este estava hospedado em sua casa, durante uma noite. Um ato visto como altamente imoral e covarde.

Após o fato consumado, Macbeth passa a sofrer dos sintomas da culpa, sinal de que ele se sentia responsável e livre diante da escolha que fez. Ele matou o Rei, sujou as próprias mãos de sangue, num ato vil e terrível, digno de toda censura. Como sintoma da liberdade e responsabilidade, ele e a esposa passaram a ser atormentados pela consciência e sentimento de culpa.

Um ato assim, do assassíneo do Rei, precisa ser mantido, consequentemente para manter a situação sob controle, outros crimes surgiram à medida que outros personagens surgiam como ameaça. Chega um momento que Macbeth inverte o status de sua relação com o Destino, que no começo era desejado, agora repudiável. Ele então passa a lutar contra o mesmo Destino à qual pouco tempo antes, ele mesmo fez questão de ir ao encontro. Por exemplo, Banquo passou a ser uma ameaça, pois o destino foi o anunciou como sendo aquele que teria filhos reis. Macbeth se revolta então com a idéia de que tudo o que ele fez, todo tormento à qual se submeteu, tenha sido realizado em benefício de outros e que no fim, por meio de sua ruína, reinaria os filhos de Banquo. Por isto providencia a morte de Banquo e de seu filho com o objetivo de extinguir a ameaça nadificadora do seu Destino. O fato de Fleance, filho de Banquo ter escapado, funcionou como uma fonte de angústia. Ele não poderia viver agora em paz, pois o filho de Banquo vive. E o Destino figurava no campo das possibilidades futuras.

A figura mitológica da deusa grega Hécate, mais as sobrenaturais aparições de espíritos, surge neste contexto auxiliando as três bruxas para o desfecho final da trama. Mas, novamente, o que temos são pronunciamentos dirigidos à Macbeth funcionando mais como elementos indutivos e provocadores do que profecias. O objetivo destas figuras maleovolas era então produzir uma Confiança excessiva em Macbeth, que segundo Hécate consiste na maior inimiga do homem. Macbeth é incitado então a atentar contra a vida do nobre Macduff. A segunda aparição de modo dúbio e enigmático faz com que Macbeth pense ser alguém praticamente invulnerável, dizendo que este não poderia ser morto por nenhum homem nascido de mulher. Por fim, a ele é dito por uma terceira aparição: "Seja valente como um leão, orgulhoso, e não dê atenção aos outros. Eles que se irritem, eles que se queixem, eles que conspirem onde bem entenderem. Macbeth jamais será vencido, a menos que o Grande Bosque de Birnam marche contra ele, vencendo as doze milhas até os altos da Colina Dunsinane." (Ato IV, Cena I).

Ora, aqui Macbeth é induzido a se comportar imprudentemente, segundo as intenções de Hécate: "Ele vai menosprezar o Destino e zombar da Morte, e nutrirá suas esperanças sem levar em consideração o bom senso, a delicadeza de espírito e os receios dos mortais." (Ato III, Cena V). Na trama, o filho do Rei Duncam, junto com Macduff, cuja família havia sido morta cruelmente a mando do tirano, receberam apoio militar dos ingleses para investir e destituir Macbeth, que com seu excesso de confiança agiu imprudentemente, não fazendo nenhum esforço para se proteger do perigo.

Sua esposa, atormentada pela culpa, sentindo constantemente suas mãos sujas de sangue, morre num ambiente de desolação. Ao receber a notícia da morte de sua esposa ele tenta minimizar o fato com palavras carregadas de um eloquente pessimismo existencial:

"Ela teria de morrer, mais cedo ou mais tarde. Mais tarde haveria um tempo para essa palavra. Amanhã, e amanhã, e ainda outro amanhã arrastam-se nessa passada trivial do dia para a noite, da noite para o dia, até a última sílaba do registro dos tempos. E todos os nossos ontens não fizeram mais que iluminar para os tolos o caminho que leva ao pó da morte. Apaga-te, apaga-te, chama breve! A vida não passa de uma sombra que caminha, um pobre ator que se pavoneia e se aflige sobre o palco - faz isso por uma hora e, depois, não se escuta mais sua voz. É uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria e vazia de significado." (Ato V, Cena V)

Logo após falar isto, Macbeth tem sua confiança abalada, quando é noticiado que o Grande Bosque de Birnam estava marchando contra ele, isto porque os soldados inimigos se camuflaram com os galhos deste bosque, fazendo uso de uma tática de guerra. E depois quando fica sabendo, no momento que lutava com Macduff, seu inimigo irado e com sede de vingança, que este não nasceu de parto normal. Inconformado e não querendo ser humilhado, não se rende, lutando até ser decapitado por Macduff.

Lendo esta tragédia pode-se perceber que em todo momento Macbeth se encontra numa situação de liberdade. Uma liberdade relativa às condições existenciais, pois esta liberdade coexiste com o Destino e com ele se relaciona. Porém, este Destino não é caracterizado por um elemento essencialista e sim como sendo a consequência das escolhas livres que faz Macbeth. A liberdade não precisa ser pensada como sendo algo pertecente somente a quem é onipotente sobre as condições existênciais, mas está presente sempre que existe alguma forma de possibilidade de ação associada às escolhas mas poder de execução. Sob as condições psicológicas, Macbeth escolheu satisfazer seu desejo de se tornar Rei, mesmo contrariando sua própria consciência e o bom-senso e as consequências de um regicídio. Escolheu acreditar apenas naquilo que a ele era favorável. Agiu de má-fé ignorando a Razão nas situações mais cruciais, que no fim culminaram em sua morte.

Concluindo, ao escolher ser Rei daquela forma, Macbeth traçou de modo livre, para si mesmo um Destino, cujo fim não tinha muitas chances de bom êxito. A obra termina e não menciona nada sobre quem sucedeu o trono. O futuro fica em aberto. O personagem Shakespeareano é um personagem humano, condicionado pela estrutura psicológica, física e social e nestas condições, sendo livre para fazer escolhas, sempre tendo como possibilidade ir por outro caminho, mesmo que seja o caminho da nadificação total da existência na recusa de se submeter às condições existenciais.

Johannes Alter.

18 de maio de 2009

Coroa do Absurdo

Como pode o Um ser Dois?

De Um surge a Alegria, surge a Dor!

De Um surge o Melhor, surge o Pior!

De Um surge o Amor, surge o Ódio!

De Um surge o Bem, surge o Mal!

Eis como é a existência!

Este paradoxo absurdo que humilha a razão,

Eis que amei o Absurdo desde o primeiro,

Desde o primeiro dia, desde o primeiro momento.

E ele é fonte de minha alegria, de meu tormento.

A ele entreguei meu Entendimento, meu coração!

Infeliz é aquele que nasceu, em vez de simplesmente,

De simplesmente ser um nada!

Ohhh, faustivo Não-Ser!

Absoluto em si, não sabe o que é alegria, não sabe o que é dor!

Não conhece e nunca conhecerá a Bipolaridade.

Coroa do Absurdo da Plenitude do Ser!

Constantin Constantius

5 de fevereiro de 2009

Aranha Voadora

Poesia composta por meu amigo Leonardo...

"Estava eu a coçar, entediado
no meu último emprego sacal
quando olhei logo acima da tela
tive uma visão fenomenal

Lá estava a aranha bizarra,
flutuando em pleno ar
Presa ao nada por seu único fio
Pos-se então a me hiponotizar

Fiquei lá, quase uma hora a fio
Estupefato com tamanha ocorrência
Uma aranha, dançando na brisa
Numa sala onde onde havia demência

Levantei-me, então curioso
Como se fosse pra outra dimensão
Precisava saber de onde vinha
O mistério daquela visão.

Por mais de dez metros andei
Em uma grande sala de passagem
Todos passavam ali distraídos
Sem prestar-lhe a menor homenagem

A teia estava presa no teto
A uns trinta graus de inclinação
Sem qualquer apoio ao certo
Flutuava em minha direção

Voltei para a minha cadeira,
Logo a frente da aranha voadora
Não lembro mais do que aconteceu,
Mas voltei à vida enlouquecedora."



Goiânia